Aos 192 anos da Independência do
Brasil, que culminou com a nossa emancipação “política” de
Portugal, não temos muito a comemorar. Somos uma nação, é
verdade, mas nada independente em inúmeros assuntos. Ainda não
aprendemos a caminhar sozinhos. Estamos imitando nossos antepassados
e outras nações em quase tudo. Somos uma nação de personalidade
pobre e imatura. Para todos os lados que olhamos estamos sofrendo
influências negativas, que adotamos como nossas de maneira
inconsciente e ainda nos vangloriamos de ser uma nação livre e
moderna, mas será que realmente somos?
Pelo menos em um ponto ainda
carregamos a herança maldita adquirida mesmo antes da chegada dos
portugueses. Estou me referindo a escravidão, que muitos aprenderam
nos acentos escolares ser uma prática portuguesa, mas que na verdade
já ocorria entre os indígenas e só foi apropriada pelos
colonizadores, que até condecoravam alguns líderes indígenas com o
título de “Dom”, que passavam a ser verdadeiros nobres do Rei de
Portugal. Não pretendo aqui enumerar as cruéis e desumanas formas
de castigos e humilhações que tupinambás, tapuias, portugueses e
espanhóis praticavam em terras brasileiras de forma oficial até o
famoso dia 13 de maio de 1.888, onde, pelo menos no papel, declaramos
“nossos” negros livres.
Transcorridos 126 anos da Lei
Áurea, continuamos assistindo claras e cada vez mais agressivas
manifestações da mais pura crueldade herdada de nossos antepassados
indígenas e europeus. Assistir a uma “menina” imatura de 23 anos
gritando a plenos pulmões a palavra “macaco” em frente a várias
câmeras e com os olhos brilhantes de tanta raiva e intolerância só
reforça como estamos educando nossas crianças. Tal fúria me trouxe
lembranças pessoais.
Me lembrei perfeitamente de um
fato ocorrido comigo no ano de 2.002, onde fui chamado de “pretinho
pobre” semanas antes de uma data que não cabe a mim detalhar neste
momento, mas que cabe sim, expressar o sentimento que percorreu
minhas veias e mente. Entendi exatamente o que o goleiro Aranha
sentiu. Uma mistura de revolta e uma sensação de impotência que
nos deixa descrente da raça humana. Estamos vivendo no Brasil, um
momento da história onde, num futuro muito distante, teremos
vergonha de descrever. A intolerância não é só em relação a cor
da pele, mas também em relação a nossas crenças religiosas, a
orientação sexual e a classe social.
Nossa involução é tamanha que
já copiamos a intolerância religiosa, algo até então inédito no
Brasil. Nunca antes assistimos tantas igrejas tendo suas imagens
religiosas sendo destruídas por ditos “cristãos”, tema que
deveríamos começar a estudar nas universidades pois, não é
possível ainda estarmos dependentes de tanta imaturidade e raiva.
Temos raiva dos negros, dos católicos, dos homossexuais e dos
pobres. Se as grandes fortunas no Brasil está nas mãos de 1% da
população, porque os 99% restantes se julgam no direito de serem
superiores em algo? Quem lhes concedeu o título de “Dom”? Somos
um país de terceiro mundo e vivemos de migalhas tecnológicas das
grandes potências! Ter um carro de R$ 100 mil ou uma casa de R$ 1
milhão não te dá o direito de agredir o favelado, mas só mostra o
quanto se é dependente de autoafirmação.
Ser “classe média” no Brasil
é o mesmo que ser favelado na Europa. O valor do dinheiro muda em
cada esquina do mundo, mas o caráter, o respeito ao próximo e a
dignidade são universais. Pense nisso. Não é a cor dos olhos, da
pele ou o dinheiro que possuímos nossos maiores bens.